Centro Cultural de São Paulo: história, arquitetura e acervo de um dos mais icônicos espaços da capital

Inaugurado no início da década de 1980, uma época em que os paulistanos nem sonhavam com facilidades como a internet, o Centro Cultural de São Paulo, que completa 42 anos nesta semana, logo se transformou em referência para estudantes, artistas e o público em geral, com uma vasta biblioteca, uma das poucas discotecas públicas, salas de espetáculo, cinema e uma arquitetura marcante.

Voltemos no tempo alguns anos, para a década de 1970, na capital paulista, a cidade autoproclamada como a mais desenvolvida do Brasil.

Naquela época, de fato, São Paulo já era uma metrópole. Segundo levantamentos do Censo, do IBGE, em 1970 a cidade já era habitada por aproximadamente 5.978.977 moradores. Este número viria a crescer para 8.587.665 em 1980.

A rede pública de educação básica já abrangia praticamente todos os bairros da cidade, com escolas municipais e estaduais, além das privadas, em número menor. Era uma época que a difusão do conhecimento não dispunha das facilidades que temos hoje com o advento da internet.

Se hoje uma pesquisa sobre qualquer assunto está a segundos de uma busca no Google, na época um estudante precisava necessariamente recorrer a fontes como as bibliotecas. Ou para quem tinha condições (já que eram produtos caros) as enciclopédias, como a Barsa, a Britannica ou a Lavoisier, vendidas por representantes das editoras de porta em porta.

Neste contexto as bibliotecas públicas, geridas pelo Sistema Municipal de Bibliotecas, criado na década de 1950, eram amplamente frequentadas pelos estudantes.

Óbvio dizer que a cidade contava com teatros e cinemas, galerias de arte e espaços para shows. Mas, a maior cidade brasileira não tinha um local em que todas estas funções culturais convergissem.

A ideia de um centro cultural

Obras da construção do Centro Cultural São Paulo.
Obras da construção do Centro Cultural São Paulo.

A história do Centro Cultural São Paulo começa na década de 70, quando um terreno entre a rua Vergueiro e a Avenida 23 de Maio foi cedido para a prefeitura. Fruto das desapropriações ocasionadas pela construção do metrô, a área de aproximadamente 300 mil metros quadrados havia sido alvo de diversas especulações. 

Em julho de 1973, na administração de Miguel Colassuono, surgiu o Projeto Vergueiro, cujo objetivo era promover a urbanização do local, onde seriam construídos um complexo de escritórios, hotéis, um shopping center e uma grande biblioteca pública. O prazo para o término das obras era de cinco anos.

Dois anos depois, a administração de Olavo Setúbal cancelou o Projeto Vergueiro. Do plano antigo restou somente a ideia da construção da biblioteca pública e para isso, foi instalada uma comissão de estudos que contava com bibliotecários, professores e o arquiteto Aron Cohen. 

A ideia do grupo era construir uma biblioteca moderna em que o leitor tivesse livre acesso ao material. O arquiteto Eurico Prado Lopes venceu a concorrência aberta em 1976, e as obras do que seria apenas uma biblioteca tiveram início em 1978.

Obras da construção do Centro Cultural São Paulo.
O terreno havia sido desapropriado para construção da estação Vergueiro do Metrô.

A gestão seguinte, do prefeito Reynaldo de Barros, resolveu reformular o projeto da biblioteca e adaptá-lo ao de um centro cultural multidisciplinar nos moldes dos que estavam surgindo no mundo todo, como o Georges Pompidou, fundado em 1977 na cidade de Paris (França). 

Contribuiu para esta mudança de visão o então secretário municipal de cultura, Mário Chamie, que alegava que a localização era ideal para a instalação de uma instituição como essa e que a obra era grande demais para abrigar somente uma biblioteca. Ficou decidido, então, que o centro cultural contaria com cinema, teatro, espaço para recitais e concertos, ateliês e áreas de exposições. Os arquitetos Eurico Prado Lopes e Luiz Telles continuaram à frente do projeto.

O edifício foi projetado com o objetivo de facilitar ao máximo o encontro do usuário com aquilo que seria oferecido no centro cultural. Dessa maneira, a arquitetura do prédio não obedeceu a padrões pré-estabelecidos, privilegiando as dimensões amplas e as múltiplas entradas e caminhos.

Construção e inauguração

Obras da construção do Centro Cultural São Paulo.
O Centro Cultural ousou com uma arquitetura moderna para a época.

A proposta então inovadora de valorizar o aspecto multidisciplinar dos espaços e evitar a compartimentação foi alvo de muitas polêmicas na época pois, além de apresentar conceitos inéditos como integração e multidisciplinaridade, sua construção contou com problemas de ordem técnica, já que apresentava muitas inovações arquitetônicas. 

Pesquisas e experimentações tiveram que ser realizadas antes que se pudesse chegar ao produto final. Para viabilizar as formas arrojadas pretendidas pelos arquitetos, utilizou-se os mais variados materiais, como vidro, aço, concreto, acrílico, tijolo e tecido e todas estas experimentações levantavam críticas por parte de setores mais “conservadores” da engenharia, arquitetura e mesmo da sociedade.

As estruturas mistas previstas no projeto fizeram com que conceitos tradicionais de execução tivessem que ser modificados, dando lugar a novas técnicas muito específicas, em um processo que beirou o artesanal.

Vista interna do CCSP.
Uma estrutura sem paredes, na qual os espaços “conversam” entre si.

Ao final, entretanto, o espaço se tornou um exemplo de uma arquitetura arrojada e integrativa. Ampla, funcional e moderna, até hoje.

A inauguração aconteceu no dia 13 de maio de 1982. O prefeito Reynaldo de Barros e o secretário de cultura Mário Chamie receberam um grande público entre convidados, participantes da obra e a população em geral. 

O Coral Paulistano e o pianista João Carlos Martins realizaram as primeiras apresentações musicais do espaço, que contou com uma exposição de obras do acervo da Pinacoteca Municipal.

Espaços e acervos relevantes do CCSP

Arrojado em sua arquitetura, o Centro Cultural São Paulo nasceu também com uma proposta de curadoria pensada na diversidade de interesses e necessidades.

Assim, ao ser inaugurado, foi transferido para o Centro Cultural o acervo da Discoteca Pública, pensada por Mário de Andrade, em 1935, quando o músico, escritor e pesquisador, fundou o Departamento de Cultura de São Paulo.

Discoteca do CCSP.
Uma das principais discotecas e acervos de partituras do país.

Mário de Andrade havia idealizado uma discoteca pública, onde seria mantido o acervo de uma das instituições que sonhava criar: uma rádio-escola. “As irradiações musicais vivem grandemente do emprego do disco”, escreveu o modernista em ofício ao então prefeito, Fábio Prado, pedindo orçamento para comprar álbuns de “música erudita nacional”, “música popular nacional”, “composição estrangeira erudita”, “música popular estrangeira” e outros “de caráter científico, documentário ou didático”.

A rádio-escola nunca saiu do papel, mas a discoteca se tornou um dos legados duradouros do período de Mário como gestor público. 

A Discoteca Oneyda Alvarenga — batizada com o nome da discípula e amiga de Mário que administrou a instituição desde o início até se aposentar, em 1968 tem cerca de 72 mil discos (45 mil de 78 rotações e 27 mil LPs), 62 mil partituras e 5 mil periódicos relacionados à música, além do material coletado pela Missão de Pesquisas Folclóricas, coordenada por Mário na década de 1930. É uma das poucas existentes no Brasil, junto com a Discoteca Pública Natho Henn de Porto Alegre, e o Arquivo Nirez de Fortaleza.

Outro espaço relevante do Centro Cultural São Paulo é a Biblioteca Pública Municipal Louis Braille.

Planejada e equipada para atender pessoas com deficiência visual, reúne cerca de cinco mil títulos, entre livros em braille e audiolivros, além de computadores e scanners com programas específicos para a acessibilidade de deficientes visuais.

Além destes dois espaços, o acervo permanente do Centro Cultural São Paulo inclui a Coleção de Artes Alfredo Volpi. Seus vastos exemplares abrigam o acervo de artes do CCSP, que se originou da Biblioteca Mário de Andrade e do IDART (Departamento de Informação e Documentação Artísticas).

Vista da área interna da Biblioteca Sérgio Milliet.
Vista da área interna da Biblioteca Sergio Milliet.

A Gibiteca Henfil é composta por uma coleção com mais de 10 mil títulos entre álbuns de quadrinhos, gibis, periódicos e livros sobre HQ. Para as crianças, o CCSP oferece a Sala de Leitura Infantil, que além de um espaço de convivência físico no local, voltado à formação de leitores, tem também uma biblioteca circulante focada na literatura infanto-juvenil.

Por fim, a Biblioteca Pública Municipal Sérgio Milliet é a segunda maior biblioteca pública da cidade de São Paulo, (atrás apenas da Mário de Andrade) e é constituída por um acervo multidisciplinar com mais de 140 mil títulos. As temáticas são vastas e incluem literatura, filosofia, periódicos, e ciências humanas, biológicas e exatas.

Livros podem ser retirados por empréstimo

Vista da área interna da Biblioteca Sérgio Milliet.
Milhares de livros do acervo podem ser retirados por empréstimo.

Boa parte do acervo do Centro Cultural São Paulo está disponível para empréstimo.

Todo e qualquer cidadão pode solicitar o empréstimo destes títulos de forma gratuita. Estes setores integram o Sistema Municipal de Bibliotecas da Secretaria de Cultura e Economia Criativa (SMC), que é composto por 119 bibliotecas dispostas por toda a cidade e, portanto, opera segundo o seu regulamento.

Basicamente para a inscrição inicial é preciso comparecer ao Centro Cultural pessoalmente com um documento de identidade (ou equivalente, como CNH, Passaporte, Carteira de Trabalho, etc.) não há limite de idade ou de escolaridade.

É preciso também um comprovante de residência, ou no caso de albergados (moradores em situação de rua assistidos por albergues públicos) uma declaração emitida por assistente social do albergue.

Um centro cultural completo

Show no CCSP.
Shows, peças teatrais e sessões de cinema acontecem regularmente no espaço.

Além das bibliotecas e discoteca o Centro Cultural São Paulo tem uma extensa programação que engloba variadas formas artísticas.

A Sala Adoniran Barbosa é um espaço de arena com capacidade flexível, podendo receber shows musicais de diversos gêneros, desde música popular brasileira (MPB) a rock, jazz e música experimental e a Sala Jardel Filho é um teatro mais tradicional (que também recebe apresentações musicais), além de peças teatrais e espetáculos de dança.

O cinema é contemplado em duas salas de exibição: a Sala Lima Barreto e a Paulo Emílio e as artes plásticas como a pintura e escultura tem nos espaços multiusos uma programação frequente de exposições que podem ser visitadas gratuitamente.

O local promove com frequência oficinas de arte, workshops, palestras, grupos de discussão sobre arte, poesia e literatura.

Jardim Suspenso do CCSP
Um jardim suspenso pode ser frequentado gratuitamente pela população.

E, ainda que você não tenha interesse específico em nenhuma destas atividades, o Centro Cultural São Paulo tem espaços de convivência abertos ao público, como o Restaurante Nortic Food, a horta comunitária, o Foyer de convivência e os jardins suspensos, oásis de calma na agitada São Paulo.

A melhor forma de se informar sobre as atividades, exposições, shows, programação e horários do Centro Cultural São Paulo é acessando o site oficial da instituição: https://centrocultural.sp.gov.br/

Fontes:

https://centrocultural.sp.gov.br/

https://centrocultural.sp.gov.br/historia/

https://pt.wikipedia.org/wiki/Centro_Cultural_S%C3%A3o_Paulo

https://oglobo.globo.com/cultura/livros/discoteca-publica-criada-por-mario-de-andrade-em-sao-paulo-completa-80-anos-lanca-portal-17184978

https://viagemeturismo.abril.com.br/atracao/centro-cultural-sao-paulo

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