É bastante discutível os rumos urbanísticos que a cidade de São Paulo tem adotado nos últimos anos, com o adensamento sufocante de edifícios altos e praticamente sem espaço entre si em áreas antes amplas, formadas por casas, em diversos bairros da capital. A despeito do gostar ou não destes novos rumos da cidade, houve um tempo em que a arquitetura pública ou privada se valia de projetos menos padronizados e um elemento ainda se fazia importante nesses projetos: o paisagismo. Ninguém personificou mais a arte de combinar elementos da flora brasileira e arquitetura urbana do que o paulistano Roberto Burle Marx.
Quarto filho de Cecília Burle, membro da tradicional família pernambucana de ascendência francesa e de Wilhelm Marx, judeu alemão nascido em Estugarda, Roberto Burle Marx nasceu na capital paulista em 4 de agosto de 1909, após seus pais mudarem de Recife para São Paulo poucos meses antes.

Sua mãe, exímia pianista e cantora, despertou nos filhos o amor pela música e pelas plantas. Roberto a acompanhava, desde muito pequeno, nos cuidados diários com as rosas, begônias, antúrios, gladíolos, tinhorões e muitas outras espécies que plantava no jardim de sua casa paulistana.
Quando os negócios de Wilhelm Marx apresentaram dificuldades em São Paulo, a família mudou-se para o Rio de Janeiro em 1913.
Quando a nova empresa de exportação e importação de couros de Wilhelm Marx começou a ter resultados positivos, se mudaram para um casarão no bairro do Leme, local onde Roberto Burle Marx, então com 8 anos, começou a sua própria coleção de plantas e a cultivar suas mudas.
Em razão de um problema de saúde nos olhos que acometeu Roberto quando tinha por volta de seus 19 anos, a família se mudou para a Alemanha, em busca de tratamento. Apesar de terem vivido no país apenas por dois anos (1928 e 1929), este foi um período fundamental para a formação do artista.
Lá Burle Marx entrou em contato com as vanguardas artísticas europeias. Tomou contato com as obras de Pablo Picasso, Henri Matisse, Paul Klee e Vincent van Gogh, levando-o à decisão de estudar pintura no ateliê de Degner Klemn.
De volta ao Rio de Janeiro, em 1930, Lúcio Costa, que era seu amigo e vizinho do Leme, o incentivou a ingressar na Escola Nacional de Belas Artes, atual Escola de Belas Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Burle Marx conviveu na universidade com aqueles que se tornariam reconhecidos na arquitetura moderna brasileira: Oscar Niemeyer, Hélio Uchôa, Milton Roberto e o próprio Lúcio Costa.
Seu talento se espalha pelo Brasil…

A expressão artística mais conhecida de Burle Marx foi o paisagismo. Mas é injusto para com o artista reduzir seu trabalho somente a esta arte. Burle Marx transitou pela pintura, escultura, arquitetura, pela produção de vitrais, tapeçarias, mosaicos, azulejos e até design de joias.
A despeito destas atividades diversas, o paisagismo foi a expressão que mais trouxe reconhecimento ao artista, ironicamente, no âmbito público, muito mais em outras cidades do que em sua cidade natal.
O primeiro projeto paisagístico desenvolvido por ele foi o jardim para a residência da família Schwartz, em Copacabana, Rio de Janeiro, 1932. Seguiram-se projetos em outras capitais, como o jardim da Casa Forte, Cactário da Madalena, Recife, 1934, os jardins e terraços do Ministério da Educação e Saúde (atual Palácio Gustavo Capanema), Rio de Janeiro, 1938.
O primeiro jardim público de sua autoria, veio em 1938, na Praça Salgado Filho, no Aeroporto Santos Dumont, Rio de Janeiro. No mesmo ano projetou os jardins para as residências de Roberto Marinho e J. Louis Wallerstein, também no Rio.
Ainda em sua primeira década de atividade profissional, Burle Marx realiza aquele que é considerado o marco original de uma arquitetura moderna propriamente brasileira, capaz de aproximar tradição cultural e modernidade, racionalidade e imaginação, os jardins para o bairro da Pampulha (Cassino, Iate Clube, Casa do Baile, Ilha Restaurante, o roseiral e conjunto paisagístico da Igreja São Francisco), em Belo Horizonte, no ano de 1942.
…mas com atuação pública tímida em São Paulo

Talvez seu projeto mais conhecido para a cidade seja a concepção paisagística do Parque do Ibirapuera… Só que não…
Este é um dos maiores equívocos quando se fala da atuação do paisagista na capital paulista.
Burle Marx foi convidado por Oscar Niemeyer para, de fato, realizar o paisagismo do parque e chegou a apresentar o projeto para tal, mas ele foi preterido e quem efetivamente realizou a concepção paisagística do mais icônico parque paulistano foi o engenheiro agrônomo Otávio Augusto Teixeira Mendes.
O fato de não ter desenvolvido o paisagismo do Ibirapuera não significa, entretanto que Burle Marx não tenha deixado sua marca por São Paulo. O fez, principalmente para empreendimentos particulares, mas também para espaços públicos.

Dentre estes, os jardins do Jardim do Mube (Museu Brasileiro de Escultura). Criado em 1995 em uma área de 7 mil metros quadrados no Jardim Europa, o espaço tem tem jardins projetados por Burle Marx. Entre ipês, jacarandás, palmeiras imperiais e filodendros (espécie de arbusto), encontram-se também esculturas de artistas como Francisco Brennand.
Ainda no âmbito dos espaços públicos, é de Burle Marx o Jardim das Esculturas do Museu de Arte Moderna (MAM).
O Centro Cívico da cidade paulista de Santo André, na região metropolitana da capital, também e de autoria do paisagista.
Burle Marx apresentou ao longo de sua trajetória vários projetos para a municipalidade paulistana, como a reforma paisagística do Vale do Anhangabaú e do Parque Trianon (Ten. Siqueira Campos), mas que por razões diversas acabaram não sendo aprovados.

No âmbito privado, o paisagista deixou sua marca em edifícios modernistas de Higienópolis, como o Edifício Prudência, que, inaugurado em 1950 com projeto do arquiteto Rino Levi é emoldurado por jardins e painéis de Burle Marx, que assina também um mosaico de pássaros pintados à mão no hall de entrada. O prédio foi tombado pelo Patrimônio Histórico em 1994.
No acesso pelo número 1.336 da Alameda Santos, há um mosaico em concreto aparente de mais de 500 metros quadrados feito em parceria com o arquiteto e paisagista Haruyoshi Ono, instalado no edifício da FIESP (Federação das Indústrias de São Paulo). Outra obra de Burle Marx na região é o jardim suspenso do Banco Safra, na Avenida Paulista. Este último, porém, não é aberto ao público.
Parque com seu nome traz parte de seu legado

No final da década de 40, o empresário Baby Pignatari convidou o paisagista Roberto Burle Marx para realizar os jardins de sua casa, projetada por Oscar Niemeyer, no então distante bairro do Morumbi.
Por muitos anos a casa permaneceu inacabada, até ser demolida no começo da década de 1990, mas o paisagismo, que chegou a ser implantado, passou por uma intervenção e restauração feitas pelo próprio Burle Marx em 1991.
Remanescente da Chácara Tangará, a área foi doada à prefeitura e duas manchas de mata nativa foram tombadas pelo Estado de São Paulo em 1994.
O parque que recebeu o nome do paisagista foi inaugurado em 1995 e se destaca pelo conjunto das esculturas do painel de alto e baixo-relevo, espelhos d’água, jardins e palmeiras imperiais.
Atualmente o local, que traz o legado do artista paulistano, conta com um jardim de aproximadamente 4 mil metros quadrados e mais de 50 espécies de plantas, além de espelhos d’água e painel em relevo.
Fontes:
https://ims.com.br/por-dentro-acervo/as-mil-faces-de-burle-marx/
https://prefeitura.sp.gov.br/web/meio_ambiente/w/parques/regiao_sul/5733
https://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoas/484-burle-marx